É a minha historinha pessoal: a alma, de braços abertos no sol da tarde, canta para a vida, trancafiada num escritório e com medo de tudo:
Just let me wake up in the morning To the smell of new mown hay To laugh and cry, to live and die In the brightness of my day I want to hear the pealing bells Of distant churches sing...
Adormeci em frente à janela, minha tela de cinema desde tempos imemoriais. Com a bênção do céu azul e do sol fulgurante, dos botões de gérbera e dos mais diversos tipos de pássaro, deslizei em um mundo de paz, onde eu eu sou o Universo e Ele sou eu. Mesmo após despertar, continuei carregando esta sensação de plenitude - embaixo do chuveiro, os raios de sol me chamavam, e eu sorri sob a água morna, me sentindo una com o mundo.
Lá fora, uma folha caiu em uma árvore. Entendi que aquela folha caiu de mim também.
Pude SENTIR, com letras garrafais, e ser grata por cada segundo.
Saí do banheiro rodopiando gotas d'água fria enquanto me dava conta de que estivera... MEDITANDO.
Trilha sonora da epifania: Silêncio, do Madredeus.
Mais uma trilha sonora significativa para a minha busca espiritual:
Let Your Soul Be Your Pilot Sting
Let your soul be your pilot Let your soul guide you He'll guide you well
When you're down and they're counting When your secrets all found out When your troubles take to mounting When the map you have leads you to doubt When there's no information And the compass turns to nowhere that you know well
Let your soul be your pilot Let your soul guide you He'll guide you well
When the doctors failed to heal you When no medicine chest can make you well When no counsel leads to comfort When there are no more lies they can tell No more useless information And the compass spins The compass spins between heaven and hell
Let your soul be your pilot Let your soul guide you He'll guide you well
And your eyes turn towards the window pane To the lights upon the hill The distance seems so strange to you now And the dark room seems so still
Let your pain be my sorrow Let your tears be my tears too Let your courage be my model That the north you find will be true When there's no information And the compass turns to nowhere that you know well
Let your soul be your pilot Let your soul guide you Let your soul guide you Let your soul guide you upon your way...
Aí eu pensei: a gente deve nascer com o espírito zerado, sem vícios nem pré-concepções de nada. Certo? Certo. Aí começamos a experimentar a vida. Aprender uma coisa num livro, outra na lapada. Tiramos mais umas conclusões observando o comportamento alheio, e por aí vai.
Mais ou menos quando começa a segunda volta de Saturno, o espírito está tão abarrotado de informações que viramos praticamente o Google. Com terabytes e terabytes de dados armazenados na cachola, estamos preparados para viver 90% das coisas pelas quais passamos todos os dias - e aí quase não precisamos mais pensar, é só reagir no automático. Né?
Deve ser por isso que é tão difícil viver no presente.
Foi tentando (e por enquanto, ainda na tentativa) estar presente em cada momento que fui presenteada com uma bela demonstração de sabedoria vinda de um quase-desconhecido:
As pessoas colhem aquilo que plantam. Mas infelizmente, por mais que queiramos, não podemos carregar seus fardos por elas. O que podemos fazer é dar o máximo de amor possível para alegrar suas vidas. E assim evitar essa tensão toda na lombar e na cervical.
(recebi este conselho hoje no meio de uma sessão inesperada de shiatsu)
"Sei que meu olhar deve ser o de uma pessoa primitiva que se entrega toda ao mundo, primitiva como os deuses que só admitem vastamente o bem e o mal e não querem conhecer o bem enovelado como em cabelos no mal, mal que é o bom."
Clarice Lispector, Água Viva (1973).