12 de setembro de 2008

Na high society


Quinta-feira, praça de alimentação do shopping. Horário de almoço, tudo lotado. Depois de comprar o habitual calzone e suco de laranja, me dirijo à mesa para deleitar-me com minha refeição junto às companheiras de infortúnio - digo, amigas do trabalho. Perto da terceira mordida, avisto uma cara conhecida no meio da multidão, rosto redondo, cabelos pretos e uma (perpétua) camisa azul. Depois de puxar pela memória alguns (ou muitos) segundos, percebo que estou encarando fixamente um ex-governador do Estado, atualmente candidato a prefeito de nossa esburacada capitá.

Antes do cérebro se dar conta do que está prestes a fazer, a boca (como sempre) toma o controle da situação e exclama, num nível decibélico ligeiramente elevado para se fazer ouvir pelas duas incautas acompanhantes: "Eita, Furustreco!"

A que estava de frente para mim, (in)discretamente (como sempre) olha para trás ao mesmo tempo em que pergunta "QUEM?". A do lado, muito sabiamente (como sempre), limita-se a uma verificação tácita, no máximo um "ã-hã" abafado pelo barulho da turba faminta aboletada nas mesinhas ao redor.

É aí que a coisa piora.

Aproveitando a chance para fazer piada, revivo um incidente diplomático do passado, no qual famosa cerimonialista contratada por nós demonstrou súbita e anormal intimidade com este mesmo cidadão, então vice-governador, apresentando-o em um evento ultra-formal com um sonoro "Meu amigo Furustreco!". E é justamente isso que eu repito, obviamente exagerando nas vogais para gerar um tom mais dramático: "Meeeeeeu amiiiigo Furustreeeeco!".

Como que guiado por um ebó/sexto-sentido mais apurado que aquele pirralha do 'I see dead people', o rapaz levanta a cabeça exatamente nesta hora, me avista através da multidão e esboça um sorriso.

Tum-tum, tum-tum.

O sangue em minha cabeça começa a pegar fogo, permitindo-me aproveitar o maravilhoso fenômeno da surdez momentânea - quebrado apenas pelas batidas frenéticas de meu coração.

Tum-tum, tum-tum.

Como se fosse em câmera lenta (ou em efeito bullet time, para quem é pós geração Matrix), eu vejo a mão do indivíduo levantar e balançar de um lado para outro, enquanto me olha fixamente de uns 15 metros de distância.

Tum-tum, tum-tum.

Sim, ELE DEU TCHAUZINHO PARA MIM.

Sem ter onde enfiar a cara senão um saquinho de papel com meio calzone de filé com cheddar, levanto minha própria mão e retribuo o gesto.

Desnecessário dizer que as duas acompanhantes, em meio às gargalhadas, foram tangidas por mim para fora da praça de alimentação nos segundos seguintes - mas não sem elogiar o candidato pela ótima atuação no quesito 'Leitura Labial'.

2 comentários:

BETA FERNANDES disse...

Quase MORRO de rir lendo este texto. Narrativa PERFEITA.
Tem coisas que SO acontece com a gente. E quando juntas então, ninguem SEGURA :-)

AMO TU, FLORZINHA

verônica disse...

Ele identificou o reconhecimento de uma eleitora no meio da multidão. Foi um momento único de grande felicidade que precisava ser enfatizado com tchauzinho camarada!
E, claro, são coisas que só acontecem com a gente.